quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Caribe - Parte II: De Grenada a Martinique

No dia 17 de Dezembro finalmente soltamos as amarras e saímos de Port Louis, em Grenada, com destino à Tyrrel Bay em Carriacou onde havíamos combinado de encontrar o Makaio. Foi uma ótima velejada, apenas 32 milhas, um breve aquecimento para o resto da jornada.
 
Passamos a noite em uma ancoragem tranquila, encontramos nossa “família suíça” a bordo do Makaio e daí pra frente seguimos sempre juntos até Martinique. Já havíamos combinado de passar Natal e Ano Novo juntos, onde quer que estivéssemos. O Natal foi em Admiralty Bay, em Bequia (se pronuncia “Bekway”), uma noite agitada, por conta de um vento forte de SE que acabou levantando uma marola muito chata que pegava o barco pelo través. Apesar da “rolagem” inquietante do Blue Wind, nos divertimos muito, a Ani fez o peru de Natal e a galera do Makaio complementou com pratos suíços saborosíssimos! Foi uma noite muito agradável.

 
Mas foram dois dias antes dessa memorável noite de Natal que passamos pela situação mais complicada em nossa volta ao mundo, até esse momento. Era dia 22 de Dezembro de 2014, estávamos em Salt Whistley Bay, na ilha de Mayreau, lá pelas 5 da tarde. A Ani tinha saído com os amigos do Makaio para explorar a ilha e eu fiquei no barco pra trocar o rotor do gerador, que havia quebrado. Havíamos decidido sair daquela ancoragem para uma outra, um pouco mais ao sul, chamada Saline Bay, que era mais protegida para aquela condição de vento. Quando a Ani voltou, levantamos âncora às pressas, e saímos rumo à Saline Bay, que estava apenas a umas 2 milhas de distância, pois queríamos chegar ainda com a luz do dia.

O vento era de popa, soprava forte, uns 20 nós, e a onda nos empurrava pra frente, fazendo o Blue Wind surfar a 8,5 – 9,0 nós de velocidade. Dei uma olhada rápida na carta náutica, vi que tinha um reef na entrada da baía, mas não me dei conta que ele estava muito pra fora e acabei cometendo um grande errol! Coloquei o barco no piloto automático, sem ter feito a navegação de forma apropriada, afinal de contas eram apenas 2 milhas!! Quando vi que a entrada da baía estava próxima, fui pra proa ajudar a Ani a preparar a âncora, que havia subido ao contrário. Foi tudo muito rápido, quando voltei para o timão olhei para minha direita e vi a boia vermelha que deveria estar na minha esquerda! Era a boia que marcava o reef. Tentei ainda parar o barco, guinei com tudo para boreste mas era tarde demais! A onda nos empurrou para cima do reef e o Blue Wind bateu com tudo na pedra. Passou por cima da primeira e encalhou na segunda, e então ficou socando nas pedras com a quilha e com o leme, ao ritmo das ondas, que não davam trégua. Dava a nítida impressão que o barco partiria ao meio! Um grupo de rastafari’s locais nos viu e vieram com 2 barcos oferecer ajuda. Aceitei de imediato mas o líder deles já me deixou claro que eu teria que pagar pelo resgate, nitidamente se aproveitando de uma situação de desespero total. O Makaio, já ancorado, assistia atônito àquela cena, sem pode fazer nada. O dingue deles era muito pequeno e o motor de popa de apenas 2 HP não tinha a menor condição de ajudar em nada. Após uns 10 minutos de muita tensão acabamos sendo rebocados pra fora do reef pelos barcos locais e ancoramos em Saline Bay. Depois de pelo menos uma hora de negociação, finalmente acertamos um preço razoável com os locais pelo resgate e conseguimos nos livrar deles. Mergulhei imediatamente para avaliar as consequências da pancada e suspirei aliviado quando vi que apenas uma parte da quilha estava danificada, na popa, e o leme apenas levemente mordido na base, apesar das fortes pancadas que sofreu. Nesse momento agradeci a Deus por ter me livrado do pior e também por haver decidido fazer um barco, acima de tudo, muito forte!

 Em seguida chegaram Nina, Ken e Karin, nossos amigos do Makaio, com algumas cervejas geladas e foi muito bom vê-los a bordo do Blue Wind! Como sempre, super solidários e tentando me animar a todo custo, pois se deram conta que eu estava muito mal com tudo o que havia passado naqueles intensos momentos de desespero! Assim são os amigos de verdade! Estão com você nos bons momentos, com certeza, mas principalmente nos maus momentos quando você precisa mesmo de um ombro e um abraço forte pra recuperar a energia! O mesmo vale pra Ani, companheira de muitas aventuras e que embarcou comigo nesse sonho, mesmo sabendo das dificuldades que certamente encontraríamos pelo caminho. Obrigado Makaio, obrigado Ani, o apoio de vocês naquele dia nunca mais vai sair das minhas lembranças!!


Passado o susto, ficou talvez a lição mais importante da minha vida de Capitão:

Não importa o tamanho da perna ou mesmo a condição do mar. Longa ou curta, mar calmo ou agitado, planeje sua navegação com extremo cuidado, definindo waypoints seguros, checando e re-checando a previsão de tempo e todos os fatores que possam influenciar sua rota.

Um único erro, um simples vacilo e tudo pode terminar em desastre... O mar não é para amadores! Lição aprendida e assimilada!!

Depois do agitado Natal em Admiralty Bay, rumamos pra Santa Lúcia onde havíamos programado passar o ano novo literalmente “em família”, pois além da família “Blue Wind – Makaio”, viriam passar a virada de ano conosco meu pai e meus dois irmãos, além do meu grande amigo argentino Roberto, sua esposa Elba e os netos Bianca e Benício. O Roberto havia alugado um barco em Santa Lúcia e coincidiu de que estaríamos lá na mesma época. Feliz coincidência!!
Paramos alguns dias em Marigot Bay, onde passamos momentos incríveis com o Makaio e que me ajudaram muito a superar o trauma do reef de Saline Bay. Depois rumamos para Rodney Bay, onde encontramos todo mundo. Passamos a virada na praia, em frente ao hotel que meu pai e meus irmão se hospedaram, uma noite muito especial na companhia de pessoas muito especiais!

No dia 6 de Janeiro programei para tirar o barco da água, na Marina de Rodney Bay, para consertar quilha e leme. Depois tocaríamos pra Martinique, onde finalmente encontraríamos a flotilha do Blue Planet Odyssey e rumaríamos para o Panamá.

Estávamos entre dois corações pois, por um lado começaríamos nossa aventura rumo ao Pacífico porém por outro lado sabíamos que uma dolorosa despedida seria inevitável! O Makaio seguiria seu rumo Caribe acima e o Blue Wind seguiria para Oeste, sempre para Oeste, até chegar de novo ao Brasil!

No próximo post, a despedida! Bons ventos a todos!